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A consciência histórica do Cristianismo

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sexta-feira, 22 de março de 2013

LXXI - Uma lição muito importante: a conversão de Cornélio




Caso admitamos que nossos registros possuem algo de divino ou algum cárater sobrenatural, devemos admitir que nada há neles de inutil ou de ocioso, mas antes, que cada narrativa possui um propósito definido, a saber, a edificação da Igreja e seu crescimento espiritual.

Agora estamos nós diante de um texto capital...

Pois diz respeito ao processo de conversão do homem.

E este toca a questão da graça incriada e da graça criada ou seja por qual delas deva principiar a vida Cristã.

Aqui não ha acordo entre Ortodoxos e Latinos; pois enquanto os Ortodoxos acreditam que a vida Cristã parte da graça incriada, adquirida pela vontade livre, sem qualquer tipo de moção interna; os latinos, tendo aderido a opinião do Bispo Agostinho de Hipona - reforçada por Lutero e Calvino - sustentam a opinião oposta, segundo a qual a graça criada precede a graça incriada; noutras palavras, que Deus exerce seu pode ou sua influência sobre a vontade do homem através duma moção interna, para uns irresistível, para outros não.

A primeira teoria, que postula a suficiência do anúncio e testemunho externo dado pela Igreja, recebe o nome de semi pelagianismo.

A segunda teoria, quando postula a soberania absoluta da graça, recebe os nomes de gracismo, agostinianismo, predestinacionismo ou calvinismo; a que admite a possibilidade de resistência por parte da livre vontade e consequentemente a colaboração humana, chama-se molinismo ou arminianismo.

O semi pelagianismo foi ensinado oficialmente por Irineu, Clemente, Origenes, Nisseno, Teodoro e Crisóstomo; dentre outros, no Oriente e no Ocidente por Juliano de Eclano, Vicente de Lerins, Genádios de Marselha, Fausto de Riez, Gregório Dialogos... e ultimamente por Alberto Pighius, as vésperas de Trento. Quanto a doutrina de Agostinho foi adotada por Próspero de Aquitânia, Goteschalck, Aquino, a generalidade dos reformadores protestantes, os padre de Trento, Berti, Noris, Jansenius, etc

O protestantismo já no berço canonizou a teoria agostiniana e dela fez um de seus princípios fundamentais. A Igreja romana, até então cindida em dois partidos (semi - pelagiano e agostiniano) optou por ele durante o concilio tridentino, embora fizesse alguns ajustes, buscando suaviza-lo. Eis porque os teólogos protestantes como Chemnitz e Sheckendorf acusam os padres tridentinos de heresia...

Nós já escrevemos diversos artigos e ensaios sobre este tema.

Cumpre esclarecer aqui que a Igreja Ortodoxa jamais repudiou ao semi pelagianismo, professando-o até os dias atuais.

Grotius e Leibnitz foram os primeiros a percebe-lo no auge das polêmicas travadas entre arminianos e gomaristas.

Até o século XVII os apologistas da Igreja romana tudo faziam com o objetivo de demonstrar que os padres gregos dos primeiros séculos concordavam com as opiniões de Agostinho.

Ensaios inteiros foram escritos com o intuito de 'provar' que Crisóstomo teria ensinado a mesma doutrina da graça. Em geral baseados em obras apócrifas ou em traduções espúrias.

A ninguém no entanto era lícito duvidar de que a patrística grega ou a teologia ortodoxa eram tão agostinianas quanto a teologia latina.

De fato os latinos sentiam-se orgulhosos desde que Eusébio Renaudot e o grande Arnauld; haviam demonstrado a crença da Igreja Ortodoxa na presença real e produzido grande clamor entre os protestantes (que até então costumavam revindicar o testemunho da Igreja Ortodoxa para a teoria simbólica).

A alegria no entanto durou muito pouco; pois o Patrólogo Louis Ellie Du Pin; examinando os originais dos padres gregos, notou a acentuada divergência existente entre estes e a teologia agostiniana prevalescente entre os latinos.

Quando ele ousou publicar tais observações, foi amplamente condenado; exceto por um grupo de estudiosos anglicanos da igreja alta.

Hoje porém sabemos que Du Pin estava rigorosamente certo.

Pois tivemos acesso as amargas palavras publicadas por Agostinho contra Crisóstomo... ao códice do Mirabiblion pertinente a refutação com que Teodoro de Mopsuestes brindou Agostinho (acompanhada pela aprovação de S Fócio)... as notícias dos sínodos orientais que justificaram Celestio...

Eis porque Juliano não exita apresentar as teorias agostinianas como resíduos maniqueistas. E porque suscitaram tão viva resistência ja por parte de um monge como S Vicente de Lerins - autêntico técnico em matéria de traições - já por parte de Genádio de Marselha, doutor procedente dos círculos de Crisóstomo e Teodoro e opositor marcado de Próspero.

Destarte podemos compreender já porque o agostinianismo precisou aguardar mais de mil anos para ser oficialmente assumido pelas denominações protestante e romana. Apesar da imensa fama e autoridade desfrutadas por Agostinho...

Daí salientarmos a importância do relato da conversão de Cornélio.

Pois era ele um prosélito do judaismo notável por sua piedade para com os pobres.

E consta no registro dos Atos que foi visitado por um ser de natureza sobrenatural, o qual dirigiu-lhe as seguintes palavras:

"Tuas preces e esmolas subiram como mérito a presença de Deus; envia alguns homens a Jopa e faz trazer até aqui um Tal Simão, cognominado Pedro; este se acha hospedado na casa se Simão o curtidor, instalada junto ao mar. Ele te dará instruções que deves seguir." At 10,6

Ora Pedro tendo recebido o recado enviado por Cornélio, foi ter com este em Jopa; e principiou por instrui-los dizendo:

"Deus de fato não faz distinção de pessoas, MAS EM QUALQUER NAÇÃO LHE É AGRADÁVEL AQUELE QUE O OBEDECE E EXECUTA O QUE É CERTO..." At 10, 34 sg

Até arrematar o anuncio com estas palavras: "Dele dão testemunho todos os profetas, e os que acreditam em seu nome obterão o perdão de seus pecados." At 10,43

No entanto, como em seu interior Pedro hesitasse e não soubesse o que fazer:

"Veio o Espírito Santo sobre os gentios (Qual num segundo pentecostes) fazendo com que discursassem em idiomas estrangeiros."

O que regularmente sucedia-se apenas após o Batismo e a Crisma.

No entanto mesmo sem serem batizados com a água (e naturalmente sem serem crismados) eles foram contemplados com o dom externo das linguas.

Daí exclamar Pedro: Como recusar o Batismo, a estes que o próprio Espírito Santo, crismou sem a concorrência de mãos humanas?

E foram batizados e agregados a Igreja os primeiros gentios.

Tal o teor do décimo capítulo do livro dos Atos dos Santos Apóstolos.

Importa saber aqui se Cornélio, ao ser visitado pelo anjo, estava já em Jesus Cristo ou em posse da graça pela boa vontade; ou se estava ainda apartado de Deus e sem comunhão alguma com ele.

Como Cornélio por ocasião da visita do anjo nada sabia sobre fé, Cristo ou verdade; não poucos inclinam-se a segunda alternativa; segundo a qual, por não possuir a fé ou o conhecimento de Cristo, estava ele separado de Deus e espiritualmente morto.

Neste caso somos obrigados a admitir que a vontade humana é suficiente apta para converter-se a Jesus Cristo desde que seja informada a respeito de seus mistérios. E destarte que a posse da graça incriada: Deus; precede a posse da graça criada ou ao perdão dos pecados e a vivificação.

Por outro lado, caso os luteranos admitam que Cornélio estava já em posse de certa medida da graça de Deus ou fruindo duma comunhão menos intensa, terão de admitir que suas obras - em união com Deus - produziram méritos e que mereceram de fato sua conversão ao Cristianismo e a maximização da mesma graça.

No primeiro caso temos a obtenção da graça ou da conversão por ação de obras procedentes da condição natural do homem e da vontade humana; em sua semi pelagianismo. Se julgamos que Cornélio ainda não estava em Cristo...

No segundo caso temos a obtenção de um grau superior da graça ou de um aprofundamento da relação entre o homem e Deus; obtido por mérito decorrente de obras, no caso: prece e esmolas.

Caso os protestantes adotem a primeira solução, vai-se por terra a doutrina da corrupção total da natureza e do sola gratia; que são os pressupostos do agostinianismo/calvinismo. Ficando evidente que a posse da graça incriada ou seja de Deus; precede qualquer tipo de operação executada na própria natureza humana, ou seja, a graça produzida.

E fica o protestantismo sendo falso.

Caso os protestantes adotem a segunda alternativa, evidenciasse a doutrina dos méritos, igualmente repudiada por Lutero e Calvino...

E fica o protestantismo sendo falso do mesmo modo e maneira.

Pois duma forma ou de outra a narrativa segundo a qual Cornélio, por meio de preces e esmolas; obteve ou a posse de Deus ou uma aproximação maior face a ele é de todo inconciliável com o sola gratia e o sola fides de Lutero.

Assim todo homem deve voltar-se sobre sua consciência e optar ou pelo ensino da Igreja apostólica contido em At 10 ou pelos ensinos de Agostinho, Lutero e Calvino. Os quais sendo opostos e excludentes não podem ser verídicos ao mesmo tempo...

Algum grupo deve estar equivocado: ou a igreja apostólica ou o sistema protestante fundado por Martinho Lutero.


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