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A consciência histórica do Cristianismo

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quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

A paixão de Cristo> Sinóticos X João

Uma das narrativas mais complexas de todo Novo Testamento diz respeito a última semana de vida de Nosso abençoado Mestre: a ceia da Páscoa, a traição, apressamento, julgamento e a morte de que veio a padecer.

Grosso modo os fatos são os mesmo e a sequência também. A raiz do problema aqui é cronológica.

Os quatro Evangelistas concordam plenamente entre si ao assinalarem uma quinta-feira como dia da última ceia de Jesus e uma sexta-feira como data de sua morte. A dificuldade, porém, está na indicação do dia do mês: conforme os sinóticos (Mt, Mc e Lc), a quinta-feira era o dia 14 de Nisã (março/abril); a sexta-feira, por conseguinte, era o dia 15. Ao contrário, segundo São João, Jesus se despediu dos discípulos no Cenáculo na quinta-feira dia 13 e foi crucificado na sexta-feira dia 14.


Acompanhe o esquema abaixo.



Mês de Nizan                                          Sinóticos                               S João

13                                                                                                         Quinta f - Última ceia
14                                                           Quinta f - Última ceia              Sexta f   - Morte do Senhor
15                                                           Sexta f - Morte do Senhor     Diante disto há séculos os incrédulos teêm alardeado estarem diante duma contradição insoluvel.   Jamais ocorreu a eles algo tão simples como estarem os sinóticos e João servindo-se de Calendários distintos.   A própria igreja e a instituição Cristã não deixa de ser em parte responsável por um tal estado de coisas na medida em que tem romantizado ou idealizado a História dos antigos judeus, em termos duma uniformidade que eles jamais possuiram.   Estavam os judeus, desde muitos séculos antes do nascimento de Cristo, cindidos em seitas rivais com doutrinas diversas a respeito da imortalidade da alma; como já salientamos em nosso estudo a respeito da mortalidade da alma no Velho Testamento; do Canon de suas escrituras e de alguns outros pontos doutrinários... Rematada tolice supor que aqueles que estavam separados em seitas a respeito do essencial ou seja da doutrina, estivessem de pleno acordo no que diz respeito as festas e o Calendário; mormente quando o testamento antigo é vago e contraditório...   Josefo, o Talmud e os escritos do Mar morto dão a entender que cada seita: Saduceus, Fariseus, Essênios e Samaritanos (no mínimo) possuia calendário próprio, marcando as festas e solenidades de modo diverso.   Recomendamos aos positivistas cegos, que pesquisem a literatura judaica dos primeiros séculos a respeito das verdadeiras batalhas travadas entre os saduceus da casa de Boetus e os fariseus sobre a data da imolação da Pascoa quando caia no sábado ou sobre como imolar tantos milhões de cordeiros num só dia...   Naturalmente que tais disputas entre os saduceus e fariseus> conforme davam mais importância a esta ou a aquela festa ou aos sábado < também diziam respeito ao poder e ao prestigio do grupo que lograsse impor sua tradição ou seu modo de contar aos demais.   Destarte era o calendárismo um grave problema no tempo de Cristo e um problema a luz do qual devemos procurar compreender a aparente contradição existente entre os sinóticos e João.   Que nem todos ali estivessem oficiando a Páscoa no mesmo dia até os Sinóticos dão-no a entender.
Leve-se em conta, por exemplo, que, conforme Mt, Mc e Lc, as diversas peripécias do processo de Jesus se devem ter efetuado em plena solenidade de Páscoa (dia 15 de Nisã); ora tais ocupações eram incompatíveis com a lei de repouso sabático que marcava a grande data (cf. Êx 12,16; Lev 23,7). Era, sim, proibido em tal ocasião carregar armas e encarcerar um réu (cf. Mt 26,47); acender fogo como o acenderam em casa do Sumo Sacerdote (cf. Lc 22,55); caminhar do campo para a cidade, como fez Simão o Cireneu provavelmente após a sua jornada de trabalho agrícola (cf. Mc 15,21); carregar a cruz, como Jesus teve que fazer; executar uma sentença capital, como fizeram os seus carrascos; comprar uma mortalha, como a comprou José de Arimatéia (cf. Mc 15,46); preparar aromas e bálsamos para ungir o corpo morto, como o empreenderam as santas mulheres (Lc 23,56). Dificilmente, portanto, se admitirá que se tenha realizado no dia 15 de Nisã tudo que os sinóticos referem imediatamente em torno da condenação e execução de Jesus. — Destas considerações conclui-se que, segundo Mt, Mc e Lc, ao menos um grupo de judeus (os que realizaram os atos acima descritos) não havia comido o cordeiro pascoal na noite de quinta-feira, como Jesus fez, nem estava celebrando a solenidade de Páscoa na sexta-feira. Ora é justamente esta a perspectiva que se depreende do Evangelho de São João.
Ainda outra observação se reveste de importância: Jesus morreu na tarde de sexta-feira que, segundo os sinóticos, deveria ser o dia de Páscoa (15 de Nisã). Logo após o falecimento do Mestre, José de Arimatéia se aprestou por sepultar o cadáver, pois, quando baixasse o sol, entraria em vigor a lei do rigoroso repouso sabático (cf. Mc 15, 42-46); sabemos que os judeus contavam os dias de ocaso a ocaso do sol, não de meia-noite a meia-noite). Do seu lado, as piedosas mulheres prepararam os bálsamos para ungir o corpo de Jesus morto, mas, tendo caído a noitinha, interromperam o trabalho, aguardando que passasse o sábado (cf. Lc 23,56). Ora estes dizeres não teriam cabimento se a sexta-feira em que Jesus morreu era o dia de Páscoa, dia de repouso tão rigoroso como o do próprio sábado; porque se terá apressado José de Arimatéia na tarde de sexta-feira se nesta já se prescrevia a abstenção de todo trabalho? — Destes traços deduz-se com razão que José de Arimatéia e as santas mulheres não estavam celebrando Páscoa na sexta-feira em que Jesus morreu; esta sexta-feira, para eles, não era o dia 15 de Nisã.

Tais evidência parecem depor a favor da cronôlogia Joânica ou melhor a cisão existente entre os judeus do tempo de Jesus a respeito do assunto.

Parece que Jesus tinha diante de sí dois ou três calendário possiveis...

Acontece que os sinóticos descrevem o fato tomando por base determinado calendário enquanto João descreve o mesmo fato tomando por base um outro calendário. Naturalmente que isto produz alguma confusão...

Aqui mais uma vez tradições eclesiásticas de origem dúbia vieram a obscurecer o assunto. Tal a idéia predominante entre todas as seitas dos latinos de que Jesus cerebrou sua ceia no dia de quinta feira...

Os vaidosos latinos - o próprio papa Bento XVI enfatiza esta tradição defeituosa em sua Vida de Jesus - no entanto parece que não estão dispostos a questiona-la.

Sabemos no entanto, pela Didascália e por Epifânio, Bispo de Salamina, que tais coisas - ao contrário do que parece (Tendo em vista o modo defeituoso com que os antigos costumavam abreviar e resumir dando a entender continuidade temporal) - não se sucederam em um só dia ou em poucas horas mas no decorrer duma semana inteira. Basta dizer que tais registros afirmam explicitamente ter o Senhor oficiado a ceia Pascal não numa quinta mas numa terça feira...

Até meio século o apelo a tais textos ou tradições, bem poderia ser encarado com um sorrizo de desdem...

Pois nosso conhecimento a respeito da História antiga, ao invés de ser completo é precário e lacunoso; por mais exato ou seguro que seja.

Isto devido ao imenso número de fontes e de resgistros estraviados ou destruidos...

Basta dizer que Livio ao compor sua afamada História 'Ab urbe condita' deparou-se com pouquissimos documentos anteriores a 390 a C, ponderando que naquele ano os registros oficiais da cidade haviam sido destruidos pelos celtas... Dois séculos depois foram os romanos que destruiram os registros da rival Cartago impedindo-nos de conhecer tanto mais detalhadamente sua história.

Não possuimos mais a narrativa das guerras de Cesar em Alexandria, Africa e Hispânia ao que parece escrita por Hírcio e tampouco a 'História dos Etruscos' composta pelo Imperador Claudio... não possuimos sequer a carta em que Pedro Alvares Cabral notificava a D Manuel o descobrimento do Brasil!!!

Acontece no entanto que vez por outra aparece lá alguma coisa... como a carta de Pero Vaz de Caminha, os códices de Nag Hammadi, os papiros de Herculano ou os manuscristo do Mar Morto...

No caso, após a analise de tais documentos, nossos preconceitos devem ser revistos... e já não podemos simplesmente esboçar um sorrizo.

Digo isto porque dentre os manuscritos dos essênios encontrou-se um calendário religioso ante Cristão segundo o qual a Pascoa poderia muito bem ter sido comida na terça feira. Teria Jesus adotado este Calendário??? Não nos parece impossivel.

Destarte estão os sinóticos corretos quando asseveram que Jesus oficiou verdadeira Páscoa (dos essênios) e que sem embargo disto foi imolado no Paresceve duma outra Pascoa - quando os cordeiros estavam já sendo imolados (como quer João) - a dos fariseus e/ou saduceus.

Em nossa Apologia do Cristianismo Ortodoxo, analisaremos a questão tanto mais de perto, formulando respostas a todas as objeções lançadas pelos contrários e reproduzindo literalmente toda a documentação existente sobre o assunto. Como no entanto esta obra não pertence a apologética julgamos ter abordado a questão naquilo que possui de essencial e oferecido uma resposta plausível.



Resta-nos tratar da hora em que o divino Mestre foi crucificado:

A questão é posta nos seguintes termos:

Conforme S Marcos: «Era a hora terceira, quando crucificaram Jesus» (15,25), ao passo que, conforme S João, a condenação de Cristo ocorreu «por volta da sexta hora» (19,14).


Será de fato insolúvel (como já se tem dito) essa aparente divergência?

Seria de fato insolúvel caso estivesse provado que o Império romano imposto a uniformidade de pesos e medidas. Acontece que durante a antiguidade e a idade média rivalizaram diversos modelos de pesos e medidas em diferentes culturas.

Divergência que o Império romano, ao contrário da Revolução Francesa e do modelo globalizador, jamais pensou em eliminar.

Da mesma forma e modo como Dario e Alexandre evitaram suscitar choques no plano da cultura, assim procederam os imperadores romanos.

Desde que os impostos fossem pagos os povos conquistados podiam dividir e contar o tempo como desejassem...

Então devemos compreender que na Judéia do tempo de Cristo haviam no mínimo dois modos de se dividir o dia: o modo dos conquistadores romanos e o modo dos antigos judeus.


Parece que no texto acima, S joão empregou a maneira como os romanos contavam as horas. Estes as numeravam como nós, a partir da meia-noite, enquanto os orientais procediam do nascer do sol. — Nesta hipótese, conforme o quarto Evangelho, Jesus teria sido condenado cerca do meio dia e crucificado cerca de 12:30. Já segundo são Marcos ele teria sido crucificado entre as 9 e as 12 horas. Então caso consideremos que Jesus foi condenado por volta do meio dia teremos cerca de meia hora de diferença entre um relato e outro...

Devemos ficar abalados porque Marcos e João não estão de acordo a respeito de minutos ou segundos numa época em que sequer existiam relógios mecânicos de relativa precisão???

Basta sabermos que mesmo hoje com relógios que marcam milésimos de segundo e o uso generalizado de relógios de pulso, depara-mo-nos com imprecisões e incertezas do gênero em milhões de autos judiciais sem que isto chega a implicar contradição.

Devido a nosso modo e maneira de encarar a vida tomando por base o relógio e marcar o tempo segundo nossa jornada de trabalho e/ou de estudo, as quais costumam ser fixadas com exatidão inflexivel, costumamos exijir um tipo de exatidão que mesmo no tempo presente não logramos atingir. Ora semelhante tipo de contagem e exatidão típicos da mentalidade moderna nem sequer passavam pela cabeça daqueles que viveram na Judéia nos primeiros séculos desta Era.

Via de regras eles se davam por satisfeitos com a proximidade do tempo, ignorando o critério da exatidão absoluta.

Contudo a esta explicação se objeta o seguinte: É de todo inverossímil admitir tenham os romanos realizado processos judiciários de madrugada; há mesmo documentos a atestar que não o faziam por princípio (cf. Macróbio, Saturnalia 1,3; Sêneca, De ira 2,7).

A isto se responde muito facilmente.

Pois se Jesus foi pregado na Cruz cerca do meio dia deve ter sido torturado a partir das onze, quando terminou o segundo interrogatório feio por Pilatos.

Cerca das dez horas foi repudiado pelo povo, que optou por libertar Barrabas.

Donde se infere que o pretório de Pilatos deve ter sido aberto pela oito ou nove como e costume.

Quanto a João, que via de regra adota a contagem judaica do tempo ter adotado, excepecionalmente neste passo, a contagem dos romanos devemos compreender que ao contrário dos demais apóstolos, que a excessão de Tiago, fugiram e abandonaram o Salvador, João acompanhou-o até a casa do Sumo Sacerdote e em seguida até o calvário.

Como a execução foi realizada por soldados romanos é bastante provavel que João tenha ouvido algum deles mencionar a hora fatídica, expressando-se conforme sua cultura. É perfeitamente aceitável que durante aquela hora traumática as palavras do romano tivessem ficado indelevelmente gravadas na memória do apóstolo sendo por fim registradas em sua narrativa.

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